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terça-feira, fevereiro 01, 2005


[09:28]

JORNALISMO 24 HORAS
O que um blog pode ensinar
(*)

Tenho um blog há quase um ano. Anote o endereço e dê uma passadinha lá: (www.noblat.blig.com.br/).

Nunca tinha entrado em um até que inventei o meu. Ouvira falar que blog era uma espécie de diário de adolescente na internet – e ponto. O assunto não me atraía, embora atraísse meus três filhos – André, Gustavo e Sofia, todos na faixa dos 20 anos de idade.

Entre março e maio do ano passado, escrevi uma página dominical sobre política no jornal O Dia, do Rio de Janeiro. E como notícias cavadas no início da semana acabavam envelhecendo antes que a semana terminasse, um amigo sugeriu que eu criasse um blog para ter onde despejá-las a tempo e a hora.

Quando a página de O Dia foi extinta, imaginei que deveria também extinguir o blog. Só não o fiz a pedido de algumas pessoas que viam futuro nele. Eu ainda não via. E sentia falta do meio impresso onde vivi os últimos 37 anos.

Em setembro, ao instalar um medidor de audiência no blog, comecei a me dar conta de que o passatempo deixara de ser apenas passatempo.

O blog foi acessado em outubro por 151.465 visitantes únicos. Em novembro, por 100.715. E em dezembro por 106.685.

Se você entrar nele mais de uma vez por dia, o medidor só registrará uma visita. A não ser que você utilize terminais diferentes. E que cada um tenha um IP.

Fui obrigado a aprender que IP é uma espécie de impressão digital do computador. Ou melhor: a porta de entrada e de saída para a internet de um usuário ou de um grupo de usuários.

Expediente integral

É por isso que os números registrados pelo medidor de audiência do blog estão muito abaixo dos verdadeiros.

Por exemplo: a Câmara dos Deputados dispõe de cerca de 4 mil terminais. Mas eles funcionam em rede. Entram e saem da internet via quatro ou cinco IPs.

Quer dizer: no máximo, o medidor de audiência do blog contabilizará por dia quatro ou cinco visitantes únicos oriundos da Câmara.

Ora, é razoável imaginar que um blog dedicado a contar os bastidores do poder em Brasília seja acessado diariamente por mais do que quatro ou cinco funcionários da Câmara.

De resto, quem acessa o blog e se interessa por algo, copia e repassa aos amigos. Esses, por sua vez, repassam aos seus. Quer dizer: você nunca saberá ao certo quantas pessoas atinge.

Mas vamos em frente.

De madrugada

Trabalho mais horas diárias no blog do que jamais trabalhei em jornais ou revistas. Começo por volta das 10h. Uma vez lidos os seis jornais que assino, reproduzo e comento no blog as notícias mais relevantes. Em seguida, passeio pelos sites de jornais e de agências daqui e de fora. Sempre encontro alguma coisa para comentar ou correr atrás.

A partir daí, me penduro no telefone à caça de notícias frescas.

As fontes tradicionais de notícias ainda não sabem direito o que é um blog – costumam confundir com site. Mas se lhe conhecem, ajudam.

Mantenho um aparelho de rádio sintonizado na CBN. E um aparelho de televisão na Globo News ou nas TVs Senado e Câmara, a depender do dia e da hora.

Sinto falta de ir para a rua com mais freqüência atrás de notícias – mas se for, a relação custo-benefício não valerá a pena. Gastarei mais tempo. E apurarei menos notícias.

Sinto falta de trabalhar com gente, de preferência muita gente como sempre trabalhei. Tenho apenas uma estudante de Jornalismo que me ajuda em coberturas de fôlego.

Reservo algumas noites por semana para jantar com políticos e funcionários do governo.

Permaneço defronte do computador até a hora do Jornal Nacional. Depois dou um tempo.

Volto a passear pelos sites de notícias por volta das 23h. E sigo até às 2h ou 3h lendo as edições dos jornais do dia seguinte e postando notícias ou comentários.

O gosto do público

O blog é um espaço de notícias, análises e debate. Quem quiser pode escrever ali qualquer coisa – menos ofensas pessoais e palavrões.

Engordei de tanto viver sentado – e também porque parei de fumar. Em compensação, trabalho de bermuda, camiseta e chinelos.

Todo jornalista deveria ter um blog. A experiência de ser responsável por um ensina mais do que muitos anos de redação.

Ensina, por exemplo, a ser mais rigoroso na apuração de notícias.

O erro cometido no jornal ou na revista tem muitos pais. No blog, ele é só seu. Na dá para pôr a culpa no repórter, no editor que mudou o que você escreveu ou no diagramador que por descuido baixou a penúltima versão de sua matéria.

Ensina a ser mais humilde.

O leitor do blog não quer nem saber: baixa o pau no que você escreve. E as críticas dele, procedentes ou não, ficam registradas. Eu, pelo menos, não as elimino. Se o fizer, estarei na contramão do espírito democrático da internet. E elas aparecerão novamente. Não tem jeito.

O blog ensina também a levar mais em conta o gosto dos leitores.

Eles manifestam com clareza sua preferência por determinados assuntos. E a não ser que audiência seja algo que pouco lhe importe, você acabará levando em conta o gosto do seu público.

Lula, leitor e paixão

É reduzido o grupo de leitores que comentam as notícias – no caso do meu blog, algo como uns 60 a 80. Eles usam nomes falsos e, às vezes, se valem de vários nomes. Mas os que comentam são muito ativos. E gostam de colaborar com o blog apurando notícias.

Eu me empenho em valorizar a contribuição deles. Não raro, pinço comentários de uns e de outros e os destaco no espaço principal do blog. Privilegio comentários que divergem dos meus. E respondo à maioria das perguntas ou provocações que me fazem.

Disse há pouco que o blog ensina a levar mais em conta o gosto do público.

Bem, nem por isso você deve se render a ele.

A minoria dos leitores que escreve no blog não representa em todos as ocasiões o gosto médio do total da audiência. Tenho pesquisa que mostra isso. É uma minoria que aprecia bater boca e que tem fixação por determinados temas.

No caso do meu blog, ela se divide entre os que atacam e os que defendem com paixão o PT e o governo Lula.

Cortesia em família

Às vezes vira um diálogo de surdos: escrevo sobre as eleições iraquianas e os leitores discutem sobre a viagem de Lula a Davos.

Não importa: escrevo assim mesmo.

Essa é outra vantagem de fazer jornalismo em blog: você não tem patrão. Desfruta de ampla liberdade.

Se tudo correr bem, em março ou abril o blog será reformado. Ganhará novo desenho, novos conteúdos e recursos que tornarão a navegação mais fácil e ágil. Será uma espécie de blog dentro de um site – ou de site dentro de um blog. Oferecerá até música.

Então verei se além de me dar prazer e muito trabalho, o blog será capaz de me dar algum dinheiro. Por ora, ele não me rende um tostão. É uma cortesia da minha mulher que paga as contas da casa, mas que não parece disposta a continuar pagando por muito tempo. E ainda reclama de que não saio da frente do computador.

(*) por Ricardo Noblat, jornalista. AQUI



 


Postado por Ana M.C_Portugal