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REPORTAGEM Para morder a Maçã (*)
«Erotic New York» de Tim Haft
Se depender do americano Tim Haft, a cidade que nunca dorme tem mais algumas razões para virar a noite. Ele é o autor de “Erotic New York – The Best Sex in the City”, um guia local vendido em qualquer livraria e que, mesmo sem listar restaurantes, tem o poder de abrir apetites. O lançamento da edição de 2005 foi comemorada na quinta-feira, 20 de janeiro, com festa. “O evento foi de arromba, com jogos eróticos e outras surpresinhas”, avisa Tim, um profissional de educação física de 44 anos.
Com o mesmo formato, fino e esguio, do “Zagat Survey”, a bíblia gastronômica nova-iorquina, “Erotic New York” cabe em qualquer bolsa – saída ideal para situações de emergência. Suas páginas sem fotos listam cerca de 200 lugares na Ilha de Manhattan analisados meticulosamente pelo preciso número de 69 sexperts sob a supervisão e edição de Tim. A leitura é recheada ainda de frases de celebridades. Woody Allen, por exemplo, diz que “sua opção é hetero, mas que ser bissexual dobra imediatamente as chances de se dar bem num sábado à noite”.
A terceira versão do guia – a primeira foi lançada em 1998 – ganhou dezenas de novos endereços. “Cansei de escutar histórias monótonas sobre a vida dos meus amigos casados”, diz. “Todas as relações passam por fases mais frias. Quis dar uma ajudinha para aquecê-las.”
O guia é democrático: traz dicas para todos os fetiches, lados e posições. Para evitar qualquer mal-entendido, cada item é acompanhado por ícones que indicam o público alvo: heterossexuais, gays, lésbicas ou transexuais. Encontram-se bares de strip tease, lojas de DVD, vídeos e peepshows, casas sadomasoquistas, festas eróticas, lojas de “brinquedos”, butiques de moda ardente, literatura, arte e artistas. Para quem se preocupa mais com os endereços do que com a variedade do cardápio sexual, o guia também é divido por bairros.
Tim Haft conta que nem a epidemia da Aids nem a administração Rudolph Giuliani afetaram o mercado. “Vimos apenas uma diminuição da quantidade de saunas gays, onde aconteciam grandes orgias. Giuliani, por sua vez, trouxe mudanças visíveis para a Times Square, outrora epicentro do sexo, hoje tomada por cinemas e lojas. A maior parte dos lugares eróticos é underground, fora da vista dos turistas, e isso nunca mudou.”
O autor do guia afirma que o estilo burlesque, mulheres que dançam, provocam mas não se despem, algo popular na década de 30, até hoje continua a atrair muita gente. “É algo visto como sofisticado e de bom-gosto.” E bastante freqüentado por mulheres na platéia.
Mini-guia
Tim selecionou cinco lugares para deleitar os leitores do NoMínimo pela Internet. A loja Toys in Babeland – aberta de meio-dia à meia-noite, no Lower East Side, um bairro antigo ocupado também por judeus ortodoxos, mas que tem ressurgido como um dos mais vanguardistas da cidade – merece uma visita. Lá se encontra de loções e calcinhas que transformam mulheres em, digamos, super-homens a vibradores de todos os gostos e cores e ainda com mil e uma utilidades. Um deles, rosa-trasparente, promete “fazer tudo, menos lavar a louça”.
A Agent Provocateur, localizada no SoHo, explicitamente entre as lojas de alta-costura, é outra opção. Nela se pode provar cintas-liga e lingeries que fazem a linha sexy-sofisticado a sutiãs que sustentam, mas deixam os seios totalmente à mostra. De acordo com os sexperts, a loja só oferece um tamanho de sutiã: o pequeno. Maior pra quê?
Para casais no auge da criatividade, Tim Haft sugere o Den of Inquity. “Não há nada pior do que ter a polícia a sua porta só porque o vizinho da frente flagrou você vestindo o seu marido com roupas de látex”, ensina o guia. Den of Inquity é, certamente, o lugar para extravasar desejos obscuros. O lugar, dirigido por Mistress Tara, fica no bairro de Chelsea. Trata-se de um espaço de uns quatrocentos metros quadrados dividido por ambientes como o Water World –, uma sala com jacuzzi e hidroterapia torturantes – ou a réplica de um consultório de ginecologia – para os que se ligam em brincar de médico. O endereço não é divulgado. Para marcar hora, deve-se telefonar ou enviar e-mail.
Tim Haft recomenda ainda, para quem gosta de arte erótica, a galeria Art at Large. No “Erotic New York – The Best Sex in the City”, ela ganha a referência de “celebração à forma e ao comportamento humano”.
Na categoria festas eróticas, a sugestão é participar da OneLegUp uma organização fechada para sócios que promove festas em que o sexo é liberado. Para fazer parte da orgia é preciso passar por um pente-fino, além de pagar uma anuidade. As festas privativas são chamadas de eat-in – alusão a “comer no restaurante” em vez de levar a refeição para viagem.
Sempre temáticas, elas acontecem em lofts decorados para a ocasião com abundância de sofás e almofadas. O endereço é divulgado apenas para os participantes. De vez em quando, porém, a organização promove uma take-out – aquela em que se leva a refeição para comer em casa. O evento ainda assim é chique. Camiseta e calça desbotada nem pensar. Na versão take-out o sexo é apenas implícito e não-sócios também são bem-vindos. A repórter do NoMínimo foi conferir.
Convidada de honra
Como em todo evento nova-iorquino, é preciso primeiro enviar o RSVP por e-mail. A resposta é sugestiva:
“Dear Erotic OneLegUpper’s, Este e-mail confirma que a nossa sexy equipe recebeu seu RSVP. Sugerimos que vocês se vistam de acordo com o tema da noite: Moulin Rouge. Get Oral, OneLegUpNYC”
O local escolhido é a boate Salon, fechada para o evento. Localizada no West Village, na avenida que beira o Rio Hudson, ela revela uma linda vista da cidade. Espero minha companhia na porta – jantamos em lugares diferentes e combinamos nos encontrar ali. A entrada é discreta. Nada indica o que se passa lá dentro. Tirando uma mulher de peruca rosa e meia-arrastão, acompanhada de um senhor que faz o estilo “madrugada em Copacabana”, todos exibem aparência de gente discreta.
Um rapaz de uns 30 anos chega sozinho. É barrado. Homens desacompanhados não entram. Mulheres, sim. O celular toca, meu parceiro avisa que acaba de perder a carteira no táxi e que sua noite será um inferno, mas engulo seco e entro sozinha. Desembolso 25 dólares, preço do ingresso para mulheres desacompanhadas, depois de meia-noite - para o casal fica por 65 dólares. Depois de deixar o cachecol de plumas brancas, o gorro, o casaco, a suéter, além de seis dólares, à camareira, é que se percebe que não há saída numa festa em que se despir é o barato – ou caro. A máscara veneziana em forma de borboleta, escondida na bolsa, é a saída Moulin Rouge para o desastre que seria encontrar alguém conhecido.
Cerca de 150 pessoas balançam o corpo numa animação rara em festas nova-iorquinas, nas quais se fala muito e se dança pouco. Lustres imensos refletem uma luz baixa. Parece cabaré parisiense. Mulheres seminuas, com desenhos pelo corpo e coroas de plumas, rebolam sobre o balcão. Na pista, uma mulher pinta o corpo de um homem sem camisa. A abordagem de um homem que aparenta ter uns cinqüenta anos não podia ser mais inusitada. Ele me abraça e convida para dançar – com ele e a mulher dele. Melhor sair de fininho.
Mulheres usam corpete e cinta-liga ao estilo Tiazinha. Outras exibem adesivos sobre os seios. Ninguém está completamente despido. Uma moça de uns 30 anos samba tão bem que entrega a nacionalidade, enquanto beija e abraça calorosamente... a namorada. Na fila do banheiro misto, homens e mulheres esperam a vez – juntos. Outro cavalheiro, até então vestido de paletó e gravata, faz a abordagem estilo curioso. A estratégia é adivinhar de onde sou. Dá a volta ao mundo, mas nem chega perto da América Latina. Trata-se de um grego.
“A festa de hoje é para as pessoas se conhecerem. Nas festas fechadas para sócios, as pessoas transam nos sofás, por todos os lados. Nunca fiz isso”, diz ele, antes de se corrigir: “Quer dizer, uma vez fiz”. Depois, puxa sua “amiga”, advogada de uma companhia telefônica americana, para me apresentar. Maquiagem pesada, cabelos cacheados, vários quilos acima do peso e um corpete oceanicamente decotado, ela comenta que acaba de chegar de uma viagem de negócios à Bahia. Pergunta se é a minha primeira vez nesse tipo de festa. Digo que sim. Ela passa a mão levemente sobre o meu ombro e seios e diz: “Então você é virgem”.
Eles me puxam para dançar na pista lotada. Ao nosso lado, um casal de mulatos carrega uma câmera digital, artefato proibido nas festas do OneLegUp – gravadores e filmadoras são igualmente proibidos. O grego se apodera da câmera e tira uma foto do casal: ele lambendo os seios dela. Depois aponta Palagia, a organizadora dessas festas. Trata-se de uma grega como ele, de trinta e poucos anos, que deixou a carreira de relações públicas para se dedicar ao mercado de festas eróticas. Loira, de cabelos lisos, ela veste apenas uma calcinha bem-comportada de babados vermelhos – estilo almofada artesanal. “Você sabia que vários casais vêm aqui para conhecer mulheres?”, pergunta-me, com certa malícia, o grego, antes que a advogada o puxe pelo braço para se juntarem a um casal que dançava encaixado na pista. É a senha para uma saída à francesa.
por Tania Menai. AQUI
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